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O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), por meio do Procurador-Geral de Justiça, Eduardo Gussem, obteve, na tarde desta última terça-feira (03/04), decisão liminar do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), determinando que os Procuradores da República designados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) se abstenham da prática de quaisquer atos não adstritos às suas atribuições legais e constitucionais, assegurando, dessa maneira, a integral autonomia do MPRJ no que tange aos trabalhos de investigação dos crimes de homicídio que vitimaram a vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes.
“...tendo em vista que o Ministério Público Federal não dispõe de poder de ingerência na esfera orgânica do Parquet Estadual, forçoso reconhecer que não tem legitimidade para imiscuir-se nas atividades investigatórias conduzidas a contento pelo Ministério Público Estadual, sob pena de manifesta ofensa à autonomia institucional do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro”, afirmou o Conselheiro Erick Venâncio na decisão liminar, que só foi proferida após a concessão de oportunidade à Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, para prestar informações, o que nem mesmo ocorreu.
A mencionada decisão foi proferida no âmbito de Reclamação protocolizada pelo MPRJ para a preservação de sua autonomia, conforme previsão nos artigos 116 e 117 do Regimento Interno do CNMP. No documento, a instituição fluminense questionou as providências tomadas pela Procuradora-Geral da República para levar à federalização das investigações. Em 15 de março, apenas um dia após os crimes, Dodge havia instaurado um procedimento preparatório, nomeando cinco Procuradores da República para instruir um hipotético pedido de deslocamento de competência para a Justiça Federal. Por meio de nota, a PGR também informou ter enviado solicitação formal à Polícia Federal para que adotasse providências para investigar os assassinatos.
A Reclamação do MPRJ pontuou que a Emenda Constitucional nº 45/2004, que prevê o deslocamento da competência para a Justiça Federal, somente pode ser invocada se ficar evidenciada a ineficiência dos órgãos estaduais, em razão de inércia, de negligência, de falta de vontade política ou de condições pessoais ou materiais para levar a cabo, em toda a sua extensão, a persecução penal. Segundo o Ministério Público fluminense, a própria rapidez com que o procedimento preparatório foi instaurado no âmbito da PGR - apenas 18 horas após os crimes - sequer ensejaria tempo hábil para a configuração da hipótese de deslocamento da competência, como pretendido pela Procuradora-Geral da República.
Ainda de acordo com o MPRJ, o deslocamento da competência só poderia ser deliberado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), por meio da via processual apropriada e observada a garantia constitucional do devido processo legal. Portanto, não é lícito à PGR adotar providências que, na prática, só poderiam ser implementadas após eventual autorização do STJ. O que a ordem constitucional lhe assegura é a possibilidade de, uma vez identificada situação de inércia ou negligência dos órgãos estaduais, inocorrente no caso concreto, requerer à Corte Superior que delibere sobre o deslocamento da investigação ou do processo para a Justiça Federal. Logo, para o MPRJ, Raquel Dodge acabou por afrontar a competência da Corte Superior, ao adotar, unilateralmente, medidas que já importavam na transferência das investigações ao Ministério Público Federal (MPF).
No mesmo sentido, a liminar concedida ontem pelo CNMP acentuou que a Constituição Federal estabelece ser da competência do STJ a verificação do preenchimento dos requisitos autorizadores da federalização. A decisão ressaltou, ainda, que os Procuradores da República designados para acompanhar as investigações dos crimes, em virtude da instauração do Procedimento Preparatório de Incidente de Deslocamento de Competência n. 1.00.000.005024/2018-37, devem agir nos estritos limites das atribuições que lhes são conferidas pela legislação.
“...não há dúvidas que, de acordo com a legislação pertinente e pelo contexto dos fatos relatados, a atribuição para realizar o controle externo da atividade da polícia civil, bem como promover a investigação para deslinde dos fatos é do Ministério Público do Rio de Janeiro, em respeito à sua autonomia funcional e em observância às atribuições legais”, destacou a decisão liminar, que, além de prestigiar os princípios constitucionais do promotor natural, do pacto federativo e da segurança jurídica, acolheu outro relevante argumento da instituição fluminense, no sentido de que a eventual apuração simultânea de um delito por dois órgãos ministeriais pode dar azo “a posicionamentos e manifestações conflitantes acerca das linhas investigatórias, podendo advir desse fato graves prejuízos para a efetividade da jurisdição penal.”.
A liminar deferida ontem ainda precisa ser referendada pelo plenário, o que poderá ocorrer na próxima terça-feira (10/04), data da próxima reunião do CNMP.
Para acessar a decisão liminar do CNMP na íntegra, clique aqui.
Para acessar a Reclamação do MPRJ na íntegra, clique aqui.
Para acessar a petição do MPRJ de reiteração do pedido de medida liminar, clique aqui.
(Dados coletados diariamente)