Notícia
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O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), por meio da Assessoria de Direitos Humanos e de Minorias, do Instituto de Educação e Pesquisa (IEP/MPRJ) e do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Violência Doméstica contra a Mulher e Núcleo de Gênero, abriu as portas, nesta segunda-feira (07/08), para o lançamento da 12ª edição do Dossiê Mulher (2017), publicado pelo Instituto de Segurança Pública (ISP). O evento é parte da programação do MPRJ em comemoração aos 11 anos da Lei Maria da Penha (nº 11.340/2006), e trouxe à discussão a realidade da violência contra a mulher no Estado do Rio de Janeiro ao longo de 2016.
A promotora de Justiça e coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Violência Doméstica contra a Mulher e Núcleo de Gênero, Lúcia Iloizio, destacou a importância estratégica para o MPRJ em sediar este evento ao apresentar dados que implicam diretamente na atuação da instituição, destinatária dos inquéritos policiais instaurados a partir dos registros de ocorrência realizados nas delegacias. Estes registros são a matéria-prima utilizada para a elaboração do Dossiê Mulher. Lucia Iloizio destacou ainda a importância do engajamento e aproximação entre as instituições presentes no evento para otimizar esforços e promover a operacionalidade da Lei Maria da Penha, principalmente em um momento de crise e carência de recursos como o atual.
O balanço da violência apresentado pela organizadora do Dossiê Mulher, a major Cláudia Moraes, mostrou indicadores ainda alarmantes dos principais crimes cometidos contra a mulher. Se por um lado houve redução nos índices de lesões corporais e ameaças em 2016, em outros casos, como nos de crimes de homicídio doloso, houve aumento de 10% em relação ao ano anterior, totalizando 396 mulheres. Com exceção dos homicídios e tentativas de homicídio, as mulheres são as principais vítimas dos delitos analisados nos registros da Polícia Civil: correspondem a 63,8% das vítimas de lesões corporais, 85% dos estupros, 90% das tentativas de estupro, dentre outros.
Os casos de estupro no Estado – 4.013 vítimas do sexo feminino – alertam para a situação das “vulneráveis”, meninas com menos de 14 anos: mais de 55,5% dos casos registrados ocorreram nessa faixa etária. Pais, padrastos, conhecidos e amigos foram acusados por 37% desses casos. “É um lado muito perverso da violência contra a mulher”, afirmou a organizadora do Dossiê Mulher, a major Cláudia Moraes. “Toda a ideia de que a rua é insegura para as mulheres e a casa é o local de abrigo e de asilo, se destrói. É dentro de casa que a mulher é agredida, ameaçada e violentada”, disse.
Além da promotora Lúcia Iloizio, participaram da mesa de abertura o procurador-geral de Justiça do MPRJ em exercício, Eduardo Lima Neto; a assessora de Direitos Humanos e de Minorias do MPRJ, Eliane Pereira de Lima; a deputada estadual Martha Rocha; a corregedora da Corregedoria-Geral Unificada, desembargadora Ivone Caetano; a tenente-coronel da Polícia Militar Aziza da Cunha Ramalho Costa, representando o comandante-geral da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, coronel Wolney Dias; a diretora da Divisão de Polícia de Atendimento à Mulher (DPAM) da Polícia Civil do Rio, Marcia Noeli, representando o chefe da Polícia Civil do Estado do RJ, Carlos Augusto Neto Leba; a diretora-presidente do Instituto de Segurança Pública (ISP), Joana Monteiro; a subcoordenadora de Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, defensora pública Maria Matilde Alonso e o secretário de Estado de segurança, Roberto Sá.
O tema mais debatido pelos participantes na abertura foi a necessidade de desnaturalização da violência sofrida pelas mulheres no cotidiano, muitas vezes no interior do próprio lar e por pessoas próximas às vitimas. “As famílias precisam ficar muito atentas e perceber os mínimos sinais”, afirmou o secretário de Estado Roberto Sá, que defendeu também uma maior qualificação do profissional de segurança pública para atender a esses casos.
Apesar desse quadro, a diretora Marcia Noeli afirmou que a Lei Maria da Penha e as delegacias especializadas de atendimento às mulheres já fazem parte do imaginário feminino e que isso teria trazido uma redução na demora das mulheres em procurar ajuda nas delegacias. Segundo a deputada estadual Martha Rocha, é preciso conhecer a realidade vivida pelas mulheres no Estado para projetar um futuro mais justo, sem preconceitos e “mais feminista”.
Para ilustrar artisticamente o tema do evento, o grupo “Mulheres Rodadas” realizou uma performance musical para questionar a naturalização da violência contra a mulher na música brasileira. Foram interpretados sambas e canções brasileiras cujas letras incitam a manutenção desse quadro. A plateia, cerca de 300 pessoas, aplaudiu emocionada. Após a apresentação, a jornalista Ana Paula Araújo assumiu a mediação da mesa de debates composta apenas por lideranças femininas.
Na mesa, foram debatidos temas como a forma desigual de violência sofrida por mulheres brancas, pardas e negras, o impacto de grandes casos midiáticos – como estupros coletivos – na manutenção da naturalização dos casos domésticos, a permanência da discriminação e segregação feminina nos mais diversos aspectos sociais, além da importância da educação na mudança da cultura de violência, através de projetos como o “Conversando sobre a Lei Maria da Penha nas escolas”, desenvolvido pelo MPRJ.
Estavam presentes na mesa de debates a major Claudia Moraes, a subsecretária Estadual de Políticas para as Mulheres, Duva Lopes, a diretora da Divisão de Polícia de Atendimento à Mulher, delegada Marcia Noeli, a deputada estadual Martha Rocha, a fundadora do “Mulheres Rodadas”, Debora Tomé, a diretora da ONG CEPIA (Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação), Leila Linhares, e a desembargadora Ivone Caetano. Ao final dos debates, a jornalista Ana Paula Araújo anunciou que foi publicada hoje no Diário Oficial a Resolução SESEG nº 1110, segundo a qual as Delegacias Especiais de Atendimento à Mulher (DEAMs) passam a ter atribuição para atendimento e orientação aos transexuais que se identifiquem como mulher.
No encerramento do encontro, a policial militar, cabo PM Annechini, do 22º Batalhão de Polícia Militar da Maré, emocionou os presentes ao dar seu depoimento. “A violência é tão escancarada que eu, policial militar, vestida da minha farda, combatendo a violência, eu mesma sofro a violência”, disse. “Os agressores não querem ser abordados por uma mulher, não aceitam e dizem ‘Quem é você?’. Eu respondo: estou vestida. O Estado diz quem eu sou para você”, contou.
(Dados coletados diariamente)