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O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), por meio dos Centros de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça Cíveis e de Violência Doméstica contra a Mulher e Núcleo de Gênero e do Instituto de Educação e Pesquisa (IEP/MPRJ), realizou, nesta segunda-feira (28/08), o seminário “Interfaces entre Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher e Alienação Parental”. No encontro, foi apresentada uma proposta de atuação integrada entre as Promotorias de Família e de Violência Doméstica.
A coordenadora do CAO Violência Doméstica, Lúcia Iloízio, abriu os trabalhos explicando a importância do tema. “Há muitos pontos de interseção que demandam o nosso máximo cuidado, inclusive para não deixarmos a mulher vítima de violência ainda mais vulnerável”, destacou.
Em sua palestra, a coordenadora do Grupo de Enfrentamento à Violência Doméstica (GEVID) do Ministério Público de São Paulo (MPSP), promotora de Justiça Silvia Chakian Santos, trouxe reflexões e inquietações em relação às questões que envolvem Síndrome da Alienação Parental (SAP), que consiste em campanha feita por um genitor para difamar o outro junto à criança. Ela lembrou que esta tese surgiu em 1985 nos EUA, mas que nunca foi aceita por lá com o valor de precedente judiciário.
O processo mais difícil de investigar, segundo ela, é o de abuso sexual, onde algumas crianças sequer sabem verbalizar o que sofreram e, por outro lado, os criminosos não exibem um estereótipo que os identifique como tal. Para Silvia, o uso da SAP por abusadores como um álibi é um problema aparentemente novo porém contaminado por mazelas antigas, como o descrédito às falas das mulheres. A promotora de Justiça citou a jurista portuguesa Maria Clara Sottomayor, que defende que a SAP oferece soluções fáceis e lineares para resolver problemas complexos, simplificando o processo de decisão e lembrou que, no Brasil, uma criança é violentada a cada 15 segundos, na maioria dos casos por um familiar ou conhecido. A raiz dos problemas, diz a promotora do MPSP, está na falta de articulação entre as varas da família e as de violência doméstica.
Em seguida, a promotora de Justiça do MPRJ Patrícia Pimentel Chambers Ramos ponderou que a Lei de Alienação Parental também beneficia as mulheres e deve ser olhada com atenção. Ela lembrou que a alienação parental pode também ser exercida pelos homens e outros parentes e que costuma acontecer contra a mulher com frequência mesmo durante o casamento, quando a mãe é desautorizada ou humilhada, em frases como “sua mãe colocou você de castigo porque ela é uma chata, eu tiro você do castigo”, “você é uma louca”, “você não cuida direito da casa” e “eu que coloco dinheiro aqui”.
Ainda segundo Patrícia Pimentel “não podemos, portanto, perder de vista que a Lei da Alienação Parental protege mulheres, bem como alguns homens que são afastados dos filhos por vingança, e sofrem por isso”, disse. Mas mesmo quando a mulher está mentindo, defende Patrícia, é preciso acolhê-la e identificar os motivos, que podem ir desde a mágoa até o medo de que a violência que já era praticada por motivos menores, diante da separação alcance um outro patamar, como o feminicídio. É preciso trabalhar de forma integrada, com a interlocução com as equipes técnicas que realizam perícia psicológica e biopsicossocial. “Temos que ter um olhar que valorize a mulher e manter em mente o princípio do melhor para a criança”, acredita a promotora.
Luciana Direito, coordenadora do CAO Cível/MPRJ, afirmou que as Promotorias de Família, de Investigação Penal e de Violência Doméstica, podem, juntas, transformar o círculo vicioso em virtuoso, se trabalharem a família. “Não raro, nas medidas de inversão de guarda, vemos que o genitor que era alienado, ao se tornar guardião, passa a ser alienador”, conta Luciana. “É preciso ter em mente que a Lei oferece uma graduação quando se instala a alienação parental, graduação essa que deve ser observada pelos operadores do direito e equipes técnicas , sendo a inversão de guarda o último recurso“, explica.
A assistente social do I Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher na Capital Marília Corrêa Silva relatou que a grande maioria das mulheres que buscam a Justiça reclama que o pai é ausente, não participa da criação dos filhos, em uma relação desigual, que as sobrecarrega. “Raras são as mulheres que solicitam que seja cortado o contato dos filhos com o pai”, declara.
A psicóloga perita do MPRJ Beatrice Marinho Paulo vê uma dificuldade na classificação dos atos. “Muitos pais chegam pedindo guarda compartilhada, mas não sabem nem o que isso significa, nem querem participar tanto da vida do filho. O que eles querem mesmo é convivência ampliada”, conta.
Beatrice citou casos de mães que desconfiam de abuso e, por isso, buscam as autoridades, porém não conseguem comprovar a prática do crime. Isto não pode ser confundido com alienação parental, segundo ela, pois mesmo que não tenha havido o abuso, a mãe estava zelando pelo seu filho. “Somente uma mãe omissa cruza os braços diante de qualquer indício de abuso. Eu costumo encaminhar ao Juízo um parecer que deixe claro que não é porque não se pode provar que foi abuso que se pode provar que não foi”, disse a psicóloga.
Ao final do evento, foi apresentada uma proposta de atuação integrada por meio de uma recomendação elaborada em conjunto pelos CAOs Cível e Violência Doméstica do MPRJ, cuja finalidade é a interlocução entre as Promotorias de Justiça que atuam nas referidas áreas, com a finalidade de preservar o melhor interesse da família.
(Dados coletados diariamente)